Os espelhos só mostram a realidade, nada mais que isso.
Criamos a ilusão de que ao nos colocarmos em frente a ele, veremos outra pessoa. Tem gente que até vê mesmo, mas não é real. É produto de uma mente que vive no futuro, esperando que tudo seja transformado no presente, sem nenhuma ação que promova isso.
Quando um homem de 40 anos se olha no espelho, ele possivelmente enxerga fios brancos na cabeça ou na barba. Percebe que o tempo passou e gosta do que vê. Lembra das viagens, dos amores (correspondidos ou não), dos estudos, dos trabalhos, das loucuras, das responsabilidades, de tudo que viveu até ali.
Esse mesmo homem de 40 anos pode também se olhar no espelho e não enxergar nada além de uma imagem irreal. Cabelos pretos, pele lisa, rosto sem marcas, barba feita. Ele volta no tempo e lembra do que não fez. As viagens só planejadas, a mudança de trabalho que não aconteceu, a moça que não foi conquistada, a faculdade que não terminou e a vida que se foi.
Os espelhos sempre nos mostrarão quem somos no momento real. Eles não mentem, não escondem, não disfarçam, não camuflam. Só refletem aquilo que somos. Verdade nua e crua. A diferença de um espelho para o outro é o seu tamanho. Quanto maior, mais nos vemos por inteiro, quanto menor, menos conseguimos ver quem somos de verdade.
Algumas pessoas preferem não ter espelhos em casa. Fogem da realidade que os assombra. Vêem algo disforme, que não combina com o pensar e o agir, acreditando que o que estão vendo não é real, e por isso, não se preocupam em parar, em silenciar, e enxergar de verdade (se é que a verdade existe) o que estão vendo.
O tempo é fugaz, e muitas vezes não o temos, para ficarmos olhando no espelho aquela pessoa tão boa e inteligente que achamos que somos. Sim, nos achamos perfeitos pelo simples fato de existirmos, mas nos esquecemos do porquê de estarmos aqui, e por isso sofremos, porque não conseguimos dar sentido à nossa vida.
O espelho, assim como o tempo, nos traz o lume daquilo que somos e não do que achamos que somos, ou do que dizemos que vamos ser. Ele é real, não ideal. O tempo que não podemos enxergar, diferente do espelho que está à nossa frente e que estamos vendo, está passando, inexoravelmente, nos mostrando que o que estamos vendo foi ele quem trouxe, ainda que não quiséssemos. Porque o tempo é cruel, ele passa, vai embora, deixa conosco o que nossa imaginação produziu, mas que nunca existiu.
Se queremos ter uma boa visão no espelho, não será pensando, sonhando ou imaginando, que vamos alcançar o nosso objetivo. Se queremos ver a beleza (se é que ela existe) refletida no espelho, não vai ser cobrando do tempo um tempo a mais ou que ele volte, vai ser fazendo, amando, agindo e vivendo.